O STJ, através da Terceira Turma, ao julgar o REsp 1475157, decidiu que a proporcionalidade da multa por descumprimento de decisão judicial (astreintes) deve ser avaliada em vista da obrigação a que ela se refere e não do montante acumulado pelo não cumprimento da determinação judicial.
A Terceira Turma adotou esse entendimento ao julgar recurso do Banco Santander num caso em que a obrigação principal era de R$ 4.620,00 e a multa, fixada em R$ 1 mil por dia de atraso, chegou a R$ 237 mil.
De acordo com o relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, não seria razoável analisar somente o valor final da multa, devendo-se considerar que algumas pessoas e empresas adotam a perversa estratégia de não cumprir a decisão judicial, deixando crescer o valor devido em proporções gigantescas, para depois bater às portas do Judiciário e pedir a revisão de valores com o argumento de que o montante se tornou inviável ou vai gerar enriquecimento sem causa da outra parte.
Na verdade, entendeu o relator que “O deslocamento do exame da proporcionalidade e da razoabilidade da multa diária, em cotejo com a prestação que deve ser adimplida pela parte, para a fase de sua fixação, servirá de estímulo ao cumprimento da obrigação, na medida em que ficará evidente a responsabilidade do devedor pelo valor total da multa, que somente aumentará em razão de sua resistência em cumprir a decisão judicial¨.
No caso em questão, o juízo de primeiro grau determinou que o valor de R$ 4.620, referente a honorários advocatícios, fosse transferido da conta em que estavam bloqueados para uma conta judicial, sob pena de multa diária de R$ 1 mil. O banco resistiu por quase oito meses a fazer o depósito, e o valor acumulado chegou a R$ 237 mil.
Diante do valor da multa, o Santander opôs exceção de pré-executividade, acolhida pelo juiz para reduzir o total da multa ao mesmo valor da obrigação principal. Essa decisão foi reformada pelo tribunal estadual, que restabeleceu o valor da multa original. No recurso ao STJ, o banco afirmou que o valor das astreintes era excessivo e que sua redução seria necessária para evitar o enriquecimento ilícito da outra parte.
Ao analisar o REsp, o STJ (Terceira Turma) esclareceu que o artigo 461, parágrafo 6º, do Código de Processo Civil (CPC) admite que o valor das astreintes seja alterado quando se mostrar insuficiente ou excessivo, mesmo após o trânsito em julgado da sentença.
Frise-se: o STJ entende que a multa poderá ser alterada mesmo após o trânsito em julgado da sentença.
Digo mais, ainda no âmbito do STJ, a jurisprudência da Segunda Seção do STJ estabelece que a redução da multa é admitida quando a sua fixação ocorrer em valor muito superior ao discutido na ação judicial em que foi imposta, de forma a evitar enriquecimento sem causa.
Ademais, a Terceira Turma, no julgamento do Resp acima citado, definiu outro critério para análise desses casos. A simples comparação entre a obrigação principal e o valor total da multa levaria fatalmente à redução deste último, apenas pelo fato de ser muito superior, mas isso prestigiaria a “recalcitrância do devedor” em prejuízo da efetividade da prestação jurisdicional.
Disse mais o relator “Penso que, nessas hipóteses, outro parâmetro pode ser utilizado, possivelmente com maior eficácia”, acrescentando que a redução não deve ser admitida quando se verifica que a multa foi estabelecida de forma proporcional à condenação e só alcançou um valor expressivo em decorrência da inércia da parte que não cumpriu a determinação judicial.
Ao analisar as peculiaridades do caso, em que a obrigação principal era de R$ 4.620, o relator votou pela redução da multa diária de R$ 1 mil para R$ 500, entendendo que este valor é mais proporcional ao da obrigação principal, mas sem alterar o número de dias em atraso.
“Tenho como adequada a redução da condenação não em razão de seu valor total, perfeitamente suportável pelo recorrente, mas apenas pela desproporção verificada no valor da multa diária fixada”, afirmou o ministro, cujo voto foi seguido de forma unânime pelo colegiado.
Considero o resultado final do julgamento razoável, na medida em que, apesar da redução, sancionou a parte executada pela recalcitrância num patamar em que, provavelmente, atendeu aos interesses da parte beneficiada.
Apesar do julgamento final ter sido razoável, tal julgamento é um pouco perigoso, tendo em vista que fixou o entendimento da possibilidade da redução da astreinte dentro de um critério SUBJETIVO do julgador que passará a valorar subjetivamente o valor da multa e o da obrigação principal.
Fonte: Eduardo Noleto (Advogado colaborador).