TJMG. Defeitos do negócio jurídico. Estado de perigo. Art. 156 do CC/2002. Requisitos. Finalidade do instituto. Quando ocorre.

TJMG. Defeitos do negócio jurídico. Estado de perigo. Art. 156 do CC/2002. Requisitos. Finalidade do instituto. Quando ocorre. O estado de perigo possui como requisitos: que haja risco de vida para o contratante ou para os familiares do contratante e que em virtude do referido risco a pessoa assuma obrigação excessivamente onerosa. A doutrina ainda exige o dolo de aproveitamento que consiste na ciência da fragilidade e da necessidade do contratante. O estado de perigo visa resguardar a boa fé dos contratantes, já que um dos contratantes não pode beneficiar-se da fragilidade da parte contrária. Conforme observam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, “o estado de perigo ocorre no momento em que se declara a vontade, assumindo obrigação excessivamente onerosa, por conta de necessidade de salvar a si ou a alguém a quem se liga por vínculo afetivo. O agente somente assume a obrigação por conta do perigo atual ou iminente, que atua como verdadeiro fator de desequilíbrio, não aniquilando a vontade por completo, mas, verdadeiramente, limitando a liberdade de manifestação” (Direito Civil – Teoria Geral, Editora Lúmen Júris, Rio de Janeiro, 6ª edição, 2007 – p. 483).

Integra do acórdão

Acórdão: Apelação Cível n. 1.0024.10.143369-6/001, de Belo Horizonte.
Relator: Des. Tibúrcio Marques.
Data da decisão: 10.11.2011.

Númeração Única: 1433696-84.2010.8.13.0024 
Processos associados: clique para pesquisar 
Relator: Des.(a) TIBÚRCIO MARQUES 
Relator do Acórdão: Des.(a) TIBÚRCIO MARQUES 
Data do Julgamento: 10/11/2011 
Data da Publicação: 22/11/2011 

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL APELAÇÃO. AÇÃO DE COBRANÇA. INTERNAÇÃO HOSPITAL. ESTADO DE PERIGO. INTELIGÊNCIA DO ART. 156 DO CÓDIGO CIVIL. NÃO COMPROVAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. O estado de perigo constitui vício que anula negócio jurídico, previsto no art. 156 do Código Civil de 2002. Compete àquele que alega ter assumido obrigação sob estado de perigo provar que contratou fora dos padrões da razoabilidade, à luz da norma inscrita no art. 333, II, do CPC. 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.10.143369-6/001 – COMARCA DE BELO HORIZONTE – APELANTE(S): IONE LÚCIA GONÇALVES, MARLENE VILELA PULIT E OUTRO(A)(S) – APELADO(A)(S): TERAPIA INTENSIVA S/C LTDA 

ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 15ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em RECURSO NÃO PROVIDO. 

Belo Horizonte, 10 de novembro de 2011. 

DES. TIBÚRCIO MARQUES, 
RELATOR. 

DES. TIBÚRCIO MARQUES (RELATOR) 
VOTO
Cuida-se de Recurso de Apelação interposto por Ione Lúcia Gonçalves e outra, nos autos da “Ação Sumária de Cobrança”, ajuizada por Terapia Intensiva S/C Ltda., tendo em vista o inconformismo com os termos da sentença de fls. 188/189, que julgou procedente o pedido inicial, condenando as rés, ora apelantes, a pagarem à autora o valor de R$5.450,00 (cinco mil quatrocentos e cinqüenta reais). 
Nas razões recursais de fls. 190/195, as apelantes alegam, em síntese, que, diante da gravidade do quadro clínico apresentado pela primeira ré, a segunda ré (irmã da primeira ré) se viu obrigada a interná-lo nas dependências do ora apelado e a entabular contrato excessivamente oneroso, que, por conseguinte, padece de vício na manifestação de vontade, eis que firmado sob estado de perigo. 
Requerem que seja dado provimento ao recurso, para que o pedido inicial seja julgado improcedente. 
O apelado apresentou contrarrazões às fls. 201/208. Requer que seja negado provimento ao recurso. 
É o breve relatório. 
Conhece-se do recurso, porquanto presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade. 
Trata-se de pedido de cobrança de valores referentes à prestação de serviços médicos hospitalares. 
As apelantes afirmaram que quando celebraram o contrato havia um vício de vontade, qual seja o estado de perigo. 
Antes de adentrar a análise dos fatos é necessário tecer algumas considerações acerca do estado de perigo. 
O art. 156 do Código Civil dispõe que: 
Configura-se o estado de perigo quando alguém, premiado de necessidade de salvar-se ou pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa. 
O estado de perigo possui como requisitos: que haja risco de vida para o contratante ou para os familiares do contratante e que em virtude do referido risco a pessoa assuma obrigação excessivamente onerosa. 
A doutrina ainda exige o dolo de aproveitamento que consiste na ciência da fragilidade e da necessidade do contratante. 
O estado de perigo visa resguardar a boa fé dos contratantes, já que um dos contratantes não pode beneficiar-se da fragilidade da parte contrária. 
Conforme observam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, 
“o estado de perigo ocorre no momento em que se declara a vontade, assumindo obrigação excessivamente onerosa, por conta de necessidade de salvar a si ou a alguém a quem se liga por vínculo afetivo. O agente somente assume a obrigação por conta do perigo atual ou iminente, que atua como verdadeiro fator de desequilíbrio, não aniquilando a vontade por completo, mas, verdadeiramente, limitando a liberdade de manifestação.” (Direito Civil – Teoria Geral, Editora Lúmen Júris, Rio de Janeiro, 6ª edição, 2007 – p. 483). 
No caso em exame, é certo que as rés contrataram com o hospital fl. 17/18, premidas pelo intuito de salvar a vida da primeira ré e de evitar a ocorrência de iminente dano. Evidente, ainda, a gravidade do estado de saúde apresentado pela paciente. 
Todavia, não há elementos nos autos capazes de demonstrar que a obrigação assumida seja excessivamente onerosa e tampouco que o hospital se aproveitou do estado de aflição das apelantes para obter vantagem exagerada. 
Ora, compete àquele que alega ter assumido obrigação sob estado de perigo provar que contratou fora dos padrões da razoabilidade, à luz da norma inscrita no art. 333, II, do CPC. 
Sobre o tema confira o recente julgado do Tribunal Superior: 
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. (…) SEGURADO E FAMILIARES QUE SÃO LEVADOS A ASSINAR ADITIVO CONTRATUAL DURANTE O ATO CIRÚRGICO. ESTADO DE PERIGO. CONFIGURAÇÃO. É EXCESSIVAMENTE ONEROSO O NEGÓCIO QUE EXIGE DO ADERENTE MAIOR VALOR POR AQUILO QUE JÁ LHE É DEVIDO DE DIREITO. DANO MORAL CONFIGURADO. – O estado de perigo é tratado pelo Código Civil de 2002 como defeito do negócio jurídico, um verdadeiro vício do consentimento, que tem como pressupostos: (i) a “necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família”; (ii) o dolo de aproveitamento da outra parte (“grave dano conhecido pela outra parte”); e (iii) assunção de “obrigação excessivamente onerosa”. (…) – O segurado e seus familiares que são levados a assinar aditivo contratual durante procedimento cirúrgico para que possam gozar de cobertura securitária ampliada precisam demonstrar a ocorrência de onerosidade excessiva para que possam anular o negócio jurídico. – A onerosidade configura-se se o segurado foi levado a pagar valor excessivamente superior ao preço de mercado para apólice equivalente, se o prêmio é demasiado face às suas possibilidade econômicas, ou se sua apólice anterior já o assegurava contra o risco e a assinatura de novo contrato era desnecessária. (…) – Impõe-se condições negociais excessivamente onerosas quando o aderente é levado a pagar maior valor por cobertura securitária da qual já gozava, revelando-se desnecessária a assinatura de aditivo contratual. (…) Recurso Especial provido. (REsp 918392/RN, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/03/2008, DJe 01/04/2008) 
A jurisprudência desta egrégia Corte é pacífica no sentido de que o defeito no negócio jurídico, apto a acarretar a sua anulação, deve ser efetivamente demonstrado, senão vejamos: 
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO MONITÓRIA PARA COBRANÇA DE CHEQUE PRESCRITO EMITIDO PARA PAGAMENTO DE DESPESAS EM HOSPITAL PARTICULAR – ALEGAÇÃO DE NEGÓCIO INVÁLIDO EM EMBARGOS À MONITÓRIA – ALEGAÇÃO DE CONTRATAÇÃO EXCESSIVA DEVIDO AO ESTADO DE PERIGO – INOCORRÊNCIA. (…) 2- Para que fosse acolhida a alegação de assunção de despesa excessiva em face da urgência do tratamento deveria ter sido comprovado que os valores exigidos pelo Hospital particular estão acima dos que são praticados por Hospitais particulares similares na região. 3- O fato de inexistir tratamento especializado em Hospital Público não é suficiente para afastar a obrigação do paciente ou seu responsável pelo pagamento das despesas em Hospital particular, não constituindo este fato, por si só, em onerosidade excessiva assumida em estado de perigo. (Número do processo: 1.0517.07.002914-8/001; Relator: PEDRO BERNARDES; Data do Julgamento: 04/11/2008; Data da Publicação: 24/11/2008). 
Ementa: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL- APELAÇÃO- AÇÃO DE COBRANÇA – INTERNAÇÃO DE URGÊNCIA EM HOSPITAL DA REDE PARTICULAR – ESTADO DE PERIGO – INTELIGÊNCIA DO ART. 156 DO Código Civil DE 2002 – PROVA – AUSÊNCIA – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA – RECURSO NÃO PROVIDO. O estado de perigo constitui vício que anula negócio jurídico, previsto no art. 156 do Código Civil de 2002. Se a parte alega estado de perigo ao assinar termo de responsabilidade para internação de paciente em unidade hospitalar da rede particular, acarreta para si o ônus de provar que as despesas cobradas são excessivas e que houve abuso por parte do contratado que aproveitou do estado de aflição para obter vantagem exagerada. (…). (Número do processo: 1.0324.05.033301-6/001; Relator: MÁRCIA DE PAOLI BALBINO; Data do Julgamento: 06/12/2007; Data da Publicação: 10/01/2008). 
Com relação aos valores cobrados, embora a quantia de R$5.450,00 (cinco mil quatrocentos e cinqüenta reais) possa parecer elevada, os gastos realizados foram discriminados no relatório juntado às fls. 19. 
Pelo que se vê de tal documentação, no atendimento foram incluídos 31 (trinta e um) plantões médicos, 15 (quinze) plantões de coordenação médica e um procedimento cirúrgico, no período de 18.11.2009, quando a primeira ré deu entrada na UTI do hospital, a 04.12.2009. 
Ao que tudo indica, o apelado apenas cobrou pelos serviços prestados, razão pela qual a obrigação não pode ser considerada como excessivamente onerosa, conforme exige o art. 156 do Código Civil, notadamente frente a ausência de provas nesse sentido. 
Com tais considerações, NEGA-SE PROVIMENTO A APELAÇÃO. 
Custas recursais pelas apelantes, suspensas nos termos do artigo 12 da Lei 1.060/50. 

DES. TIAGO PINTO (REVISOR) – De acordo com o(a) Relator(a). 

DES. JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES – De acordo com o(a) Relator(a). 

SÚMULA: “RECURSO NÃO PROVIDO.”

Fonte: www.cc2002.com.br

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