Diante da ausência de normas legais específicas ao contrato de distribuição stricto sensu e também de preceitos estipuladas contratualmente pelas partes, deve-se aplicar a regra geral sobre a extinção dos contratos, disposta no Código Civil/2002.
Integra do acórdão
Acórdão: Apelação Cível n. 1.0105.04.109473-8/001, de Governador Valadares.
Relator: Des. Lucas Pereira.
Data da decisão: 24.06.2010.
Número do processo: 1.0105.04.109473-8/001(1)
Númeração Única: 1094738-63.2004.8.13.0105
Processos associados: clique para pesquisar
Relator: Des.(a) LUCAS PEREIRA
Relator do Acórdão: Des.(a) LUCAS PEREIRA
Data do Julgamento: 24/06/2010
Data da Publicação: 14/07/2010
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO – RESCISÃO UNILATERAL – INDENIZAÇÃO – BALIZAS – CÓDIGO CIVIL DE 2002 – FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – REGRA DO ART. 20, § 3º, do CPC.Diante da ausência de normas legais específicas ao contrato de distribuição stricto sensu e também de preceitos estipuladas contratualmente pelas partes, deve-se aplicar a regra geral sobre a extinção dos contratos, disposta no Código Civil/2002Os honorários sucumbenciais devem equilibrar o trabalho do advogado e o proveito econômico que a parte pretendia com a demanda.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0105.04.109473-8/001 – COMARCA DE GOVERNADOR VALADARES – APELANTE(S): LIQUIGAS DISTRIBUIDORA S/A – APTE(S) ADESIV: FORTGÁS GV LTDA – APELADO(A)(S): LIQUIGAS DISTRIBUIDORA S/A, FORTGÁS GV LTDA – RELATOR: EXMO. SR. DES. LUCAS PEREIRA
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador EDUARDO MARINÉ DA CUNHA , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO PRINCIPAL E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO ADESIVO.
Belo Horizonte, 24 de junho de 2010.
DES. LUCAS PEREIRA – Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. LUCAS PEREIRA:
VOTO
Trata-se de ação de indenização movida por FORTIGÁS GV LTDA. em desfavor de AGIP DO BRASIL S/A.
Noticia a autora que sua razão social é GILSON SOARES DOS ANJOS – ME, cujo nome fantasia é FORTIGÁS GV LTDA., e que a razão social da ré é AGIP DO BRASIL S/A, mas seu nome fantasia é LIQUIGÁS DISTRIBUIDORA S/A. Assevera a requerente que, desde março de 1996, mantinha contrato de distribuição, com exclusividade, de gás de cozinha engarrafado pela requerida, muito embora as partes só tenham formalizado o seu credenciamento em 05/09/2001. Assegura que, antes desta formalização, as partes firmaram os contratos de depósito e comodato do vasilhame (botijões de gás) utilizado. Sustenta que vendia o gás na cidade de Governador Valadares aos consumidores finais e às revendedoras, sendo tudo acompanhado de perto pela ré. Afiança que abria os postos de revenda, mas quem arcava com os custos da propaganda (pintura – dos carros e do local – e logotipo da marca) era a requerida. Proclama que o contrato estava sendo cumprido por ambas as partes até 12/09/2003, quando a postulada suspendeu, de forma abrupta, sem justa causa e prévio aviso, o fornecimento do produto. Ressalta que notificou extrajudicialmente a ré, em 24/09/2003, com o objetivo de “provocar a abertura de um canal de negociação para restabelecer o contrato e, caso isto não fosse possível, obter o descredenciamento feito pela AGIP junto à Agência Nacional de Petróleo – ANP, para que assim pudesse buscar relacionamento com outra empresa de distribuição de gás e continuar suas atividades, obtendo recursos para fazer frente a seus compromissos financeiros” (f, 04). Realça que a ré a contranotificou, oportunidade em que confirmou o encerramento da distribuição e condicionou o descredenciamento da autora junto à ANP à devolução do vasilhame e o pagamento imediato dos títulos vencidos e vincendos, todavia, como não teve condições de cumprir as exigências impostas, a requerida protestou os títulos que tinha em mãos. Destaca que o contrato firmado entre as partes caracteriza-se como de distribuição comercial, muito embora se assemelhe ao de representação comercial. Nestes termos, garante, faz jus à percepção de indenização pela rescisão unilateral do contrato, seja por força da Lei no. 6.729/70, seja pela Lei no. 4.888/65. Sucessivamente, pugna por indenização por perdas e danos, face à rescisão do contrato sem pré aviso de 90 (noventa) dias, com espeque no art. 720, do Código Civil.
Devidamente citada, a ré apresentou a contestação de f. 69/87, repudiando a existência do contrato de distribuição entre as partes desde 1996, a uma porque a empresa GILSON SOARES DOS ANJOS – ME não figura na lide; a duas porque esta empresa não está credenciada a comercializar GLP e a três porque a FORTIGÁS GV LTDA. foi registrada na JUCEMG em 15/01/2001. Afirma que a relação comercial das partes teve início em 19/06/2001, com a assinatura do contrato de depósito, comodato e outras avenças, além de carta de fiança. Rechaça a alegação de que exigia a abertura de postos de revenda, que a autora possuía 07 (sete) veículos para revenda de GLP, bem como o recebimento da notificação datada de 18/09/2003. Destaca a inaplicabilidade do Código Civil in casu, posto que a formalização do vínculo havido entre as partes teve início antes da entrada em vigor do novo código, e o Código Civil de 1916 não previa a indenização por ausência de prévio aviso. Assevera que as partes firmaram contrato de comodato e depósito, não de distribuição ou representação comercial, até porque a lei de concessão comercial não se aplica à distribuição de GLP. Afirma que a rescisão do contrato havido entre as partes de deu por culpa da autora, que pediu o seu descredenciamento, e que os caminhões da postulante não foram carregados face à sua inadimplência. Realça a legalidade dos protestos realizados. Derradeiramente, pugna pela improcedência dos pedidos iniciais.
Impugnação às f. 211/215.
Na audiência de f. 217, foram fixados os pontos controvertidos da demanda e deferida a realização das provas oral, documental e pericial.
Laudo pericial juntado às f. 251/285. Esclarecimentos às f. 267/409.
Juntada de depoimentos prestados no processo no. 0105.06.210675-2, como prova emprestada, durante a audiência de f. 354/355.
Sobreveio sentença às f. 431/444, na qual o MM. Juiz a quo, entendendo que restou configurado o contrato de distribuição, julgou procedente o pedido inicial, para condenar a requerida a pagar à autora a quantia de R$108.588,48 (cento e oito mil, quinhentos e oitenta e oito reais e quarenta e oito centavos), corrigida monetariamente pelos índices da CGJMG e acrescida de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, contados da citação, autorizada a compensação do crédito da ré. Condenou a ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Inconformada, a ré interpôs a apelação de f. 446/462, reiterando os termos da defesa.
Contrarrazões dos autores às f. 466/472.
A autora propôs o apelo adesivo de f. 474/477, pugnando pela majoração da verba honorária sucumbencial.
Contrarrazões às f. 484/489.
Feito convertido em diligência para complementação do porte de retorno.
Conheço dos recursos, porque presentes os pressupostos de admissibilidade.
RECURSO PRINCIPAL – LIQUIGÁS DISTRIBUIDORA S/A
Na teoria geral dos contratos, como cediço, vigora em regra o princípio da autonomia da vontade, da qual decorre a liberdade das formas, facultando-se aos contratantes certa dose de discricionariedade na confecção do instrumento negocial, segundo a conveniência e necessidade de tutela dos bens jurídicos envolvidos. O abandono do formalismo, todavia, implica necessário afastamento da segurança jurídica que o rigor da forma normalmente confere.
“A forma determinada na lei, contudo, ainda existe para aqueles atos em que a lei, ou a vontade das partes, queira imprimir maior respeito e garantia de validade.
(…)
É na parte geral do Código que vamos encontrar os dispositivos que orientam a matéria. A regra geral, contudo é de liberdade de forma para os negócios jurídicos em geral.” (VENOSA, Sílvio de Salvo. Teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 440.)
O desapego à formalidade contratual indubitavelmente tem como grande expoente o contrato verbal. Essa forma, muito embora admissível, proporciona aos contratantes segurança jurídica diametralmente oposta à sua simplicidade, pois a demonstração em juízo da existência do negócio jurídico, com todas as sua nuanças, deverá vir firme no conjunto probatório, a cargo das partes, sob pena de não se terem garantidos os efeitos informalmente pactuados.
No caso em espécie, sustenta-se a existência de contrato de distribuição, com exclusividade, de gás liquefeito de petróleo – GLP, na cidade de Governador Valadares.
Jorge Lobo define o contrato de distribuição como:
“aquele pelo qual o fabricante acorda com o distribuidor o fornecimento de determinado produto a fim de que o distribuidor o venda massivamente através de sua própria organização em determinada zona, mediante uma remuneração, geralmente sob a forma de desconto do preço final. O distribuidor age em nome próprio e por sua conta e risco, não sendo representante do fabricante, para tanto adquirindo a propriedade dos bens do fabricante e revendendo-os com lucro, daí porque é ele responsável pelas sucessivas vendas do produto e não o fabricante.” (Contrato de Franchising, Rio de Janeiro: Forense, 1997, p.4)
Como se vê, o contrato de distribuição é atípico, cujas características inerentes são: consensualidade, bilateralidade, onerosidade, comutatividade, informalidade, de trato sucessivo e de cooperação, elementos que, somados, atestam sua existência.
A presença da relação de distribuição é, contudo, o componente mais importante, e assim se caracteriza:
“A situação não fica clara, mormente quando as partes não definem claramente suas obrigações, como já não estava clara no sistema anterior e qualquer das soluções apresenta dificuldades. De qualquer modo, em princípio, se o sujeito adquire os bens do produtor ou fornecedor e os revende, atendendo a cláusula de exclusividade e de área geográfica, sua situação será de distribuidor, excluindo-se a possibilidade de ser considerado representante. As gradações entre um extremo e outro deverão ser definidas no caso concreto.
(…)
Em sentido amplo, podemos conceituar distribuição como o contrato pelo qual uma das partes, denominada distribuidor, se obriga a adquirir da outra parte, denominada distribuído, mercadorias geralmente de consumo, para sua posterior colocação no mercado, por conta e risco próprio, estipulando-se como contraprestação um valor ou margem de revenda (Ghersi, 1999:104, t.2). Vimos que pela dicção legal do art. 710, a diferença que a lei admite no tocante ao contrato de agência, é que no contrato de distribuição o distribuidor tem a coisa a ser negociada à sua disposição.
(…)
Assim como o contrato de agência, trata-se de contrato consensual, bilateral, oneroso, comutativo, nominado e típico de acordo com o novo Código, informal, de duração e ‘intuitu personae’.” (VENOSA, op. cit. p. 627 e 633/635)
Nessa linha de conta, a distribuição comercial apresenta-se como uma modalidade de contrato de cooperação, pelo qual os produtores ou fabricantes buscam obter maior agilidade ou eficiência para percorrer os complexos caminhos da cadeia de consumo para fazer chegar os seus produtos ou serviços ao consumidor final, afeiçoando-se aos contratos de agência, de concessão mercantil, de franchising, e também de representação comercial, porém, sem se aplicar a legislação específica destes para sua regulação.
Analisando os documentos que compõem o conjunto probatório dos autos, verifico que, em 19/06/2001, as partes firmaram “Instrumento Particular de Contrato de Depósito e Outras Avenças” de 3.380 botijões P13 kgs de gás liquefeito de petróleo – GLP e cilindros P45 kgs, por prazo indeterminado, fornecidos com exclusividade pela depositante, com a finalidade de comercialização em sua área de representação (f. 101/104 e 111/113).
As partes firmaram, ainda, em 19/06/2001 e 13/08/2002, “Instrumento Particular de Contrato de Comodato” de instalação para revenda de GLP – gaiolas metálicas, placa luminosa de 02 faces com poste e uma para a fachada principal, tudo propriedade da comodante, ora apelante (f. 119/124).
Os termos dos contratos mencionados, como se vê, são suficientes para atestar a alegada distribuição com exclusividade.
Não bastasse isso, os depoimentos das testemunhas prestados no processo de no. 0105.06.210674-2, e juntados como prova emprestada, confirmam esta tese:
OMIR QUINTINO SOARES:
” (…) que a Fortgás é credenciada na ANP (Agência Nacional de Petróleo) para vender produtos para a Liquigás, que quem fez o credenciamento da Fortgás na ANP foi a Liquigás; (…) que a Agip exige exclusividade da embargante (…)” (f. 358/359)
MARCELO SOARES DA SILVA:
” (…) que era responsável pela emissão do contrato da Liquigás com a Fortgás; (…) que a Fortgás só trabalhava com produtos da Liquigás; que no contrato escrito rezava que o fornecimento do vasilhame se dava para venda exclusiva dos produtos da embargada (…)” (f. 360/361)
LUIZ SÉRGIO ALMEIDA FIALHO:
” (…) que o contrato previa exclusividade para a embargada (…)” (f. 362/363)
Com efeito, caberia à apelante a comprovação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, pelo sistema de distribuição do ônus probatório, previsto no art. 333, do CPC, que dispõe:
“Art. 333 – O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito.
II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.” (g.n.)
Sobre a distribuição do ônus da prova dos autores, leciona Moacyr Amaral Santos:
“Quem tem o ônus da ação tem o de afirmar e provar os fatos que servem de fundamento à relação jurídica litigiosa; quem tem o ônus da exceção tem o de afirmar e provar os fatos que servem de fundamento a ela. Assim, ao autor cumprirá sempre provar os fatos constitutivos, ao réu os impeditivos, extintivos ou modificativos…
Pode-se, pois, estabelecer como princípios fundamentais do instituto os seguintes:
1º – Compete, em regra, a cada uma das partes fornecer a prova das alegações que fizer.
2º – Compete, em regra, ao autor a prova do fato constitutivo e ao réu a prova do fato impeditivo, extintivo ou modificativo daquele. ” (in “Comentários ao Código de Processo Civil”, nº 18, IV/25 e 27).
Ovídio A. Baptista da Silva:
” (…) Como todo direito se sustenta em fatos, aquele que alega possuir um direito deve, antes de mais nada, demonstrar a existência dos fatos em que tal direito se alicerça. Pode-se, portanto, estabelecer, como regra geral dominante de nosso sistema probatório, o princípio segundo o qual à parte que alega a existência de determinado fato para dele derivar a existência de algum direito incumbe o ônus de demonstrar sua existência. Em resumo, cabe-lhe o ônus de produzir a prova dos fatos por si mesmos alegados como existentes. (…)” (in Curso de Processo Civil, Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 326)
Bem como Jônatas Milhomens:
“Teve razão Kisch ao dizer que a necessidade de provar, para vencer, chama-se ônus da prova. Se não se logra convencer o juiz da verdade dos fatos, estes não são tidos como verdadeiros na sentença, e sofre prejuízo aquele em cujo favor haveriam de produzir efeitos jurídicos os que ficaram sem comprovação. Temos como certo, portanto, que os fatos trazidos pelas partes à discussão devem ser provados para que o juiz na sentença os leve em conta; que há necessidade de provar, definindo-se, assim, o onus probandi.” (em “A Prova no Processo”, RJ, Forense, 1982, p. 170/171).
Observe-se que consta da inicial que a autora sempre cumpriu integralmente as suas obrigações, inclusive com o cumprimento de abertura de postos de revenda que eram determinados pela empresa ré, até que eladeixou de proporcionar condições necessárias para o cumprimento regular da atividade, obrigando a autora a enfrentar notável crise econômica e, com isso, tornar-se inadimplente como pagamento de algumas faturas.
A nosso aviso, a apelante não se desincumbiu de comprovar fato obstativo do direito da autora, posto que, embora afirme que a rescisão do contrato havido entre as partes tenha se dado por culpa da autora, que pediu o seu descredenciamento, se encontrava inadimplente e comercializava produtos de outros fornecedores, não produziu provas neste sentido.
Esclareça-se que a apelada notificou extrajudicialmente a apelante em 18/09/2003 (f. 30/31) e 24/09/2003 (f. 32/35), pela interrupção do fornecimento do GLP, tendo nesta última data, inclusive, solicitado à apelante o carregamento de seu caminhão com o produto (f. 39).
O teor das notificações era explícito quanto ao interesse da apelada em manter o vínculo jurídico com a apelante, sendo, contudo, o descredenciamento um fato irrefutável, face à suspensão do fornecimento do PLG e o descredenciamento verbal ocorrido, como demonstrado alhures.
Lado outro, somente em contranotificação, datada de 10/10/2003 (f. 40/43), a apelante informa que o seu preposto, em 12/09/2003, constatou nas instalações da autora produtos de outras marcas que não os da AGIP, o que caracterizava descumprimento contratual.
Com efeito, os depoimentos prestados pela maioria das testemunhas evidenciam que a ruptura do fornecimento de produtos à apelada ocorreu verbalmente, de modo repentino, sem qualquer aviso prévio ou existência de justa causa. Derrubando a tese da apelante. Senão vejamos:
OMIR QUINTINO SOARES:
“(…) que fazia o controle de estoque e vendas para a embargante; (…) que o rompimento foi de uma hora para outra e pelo que sabe o depoente não havia nenhuma dívida da embargante para a embargada, nem título protestado ou executado (…)” (f. 358/359)
MARCELO SOARES DA SILVA:
“(…) que o contrato deixou de existir em meados de setembro ou outubro em 2003; que presenciou o fato da gerência comercial de Gov. Valadares, Sr. Fábio Bertoni, ter se dirigido ao depósito da Fortgás e encerrado o contrato; (…) que o rompimento do contrato da embargante não se deu pelo inadimplemento da embargante; (…)” (f. 360/361)
A única testemunha que afirmou que o fornecimento de produtos foi suspenso em razão de inadimplência e descumprimento da cláusula de exclusividade foi LUIZ SÉRGIO ALMEIDA FIALHO (f. 362/363), contudo, muito embora a contradita não tenha sido aceita pelo d. Juízo a quo, com toda razão, o seu depoimento deve ser visto com certa cautela, face ao vínculo trabalhista-econômico-financeiro havido entre ele e a apelante.
Como constatado pelo MM. Juiz, “temos como incontroversa a data do rompimento da relação contratual entre as partes – 12/09/2003 – resultando na interrupção do fornecimento de produtos pela requerida à autora” (f. 437).
Registre-se que, pelo que se infere dos documentos, o único débito da autora com a requerida à época da suspensão do contrato era o boleto no. 25.283, emitido em 28/08/2003, com vencimento para 12/09/2003, no valor de R$3.525,00 (três mil, quinhentos e vinte e cinto reais) (f. 45/129/258), o que derruba a tese de inadimplemento e de pedido de descredenciamento.
A perícia contábil ratificou a tese da autora, pois, ao responder o quesito “f”, afirma:
“A autora possui algum tipo de débito junto à empresa ré? Em caso afirmativo, queira o i. expert informar a partir de qual data iniciou-se a situação de inadimplência.
RESPOSTA: SIM – Duplicatas Mercantis, num total de 27 – correspondente o valor original a importância de R$69.827,00.
Fato que se comprova, tanto pelo relatório de débitos anexados pela Requerente (fls. 34) como pelo relatório de fls. 49 e documentos juntados nos autos pela Requerida.
Destaca-se o mês de 09/2003, como início da inadimplência, fato verificado pelas certidões de Protesto. (…)” (f. 267)
Mais adiante, nas conclusões dos trabalhos periciais, o expert destaca que:
“(…) Verifica-se claramente, que no de 2003, a situação Econômica-Financeira da Requerente, mudou expressivamente, reflexo da queda de seu faturamento mensal, de forma acentuada a partir do mês 09/2003, conforme se vê, também, pelas Demonstrações de Resultado apuradas trimestralmente,uma vez que sua forma de tributação adotada é pelo Lucro Real, desde sua fundação. (…)” (f. 271)
Nesse esteio conclui-se, ao fácil, que, a inadimplência da apelada se deu em decorrência da suspensão do fornecimento de produtos pela apelante em setembro de 2003, antes mesmo de notificá-la expressamente da rescisão contratual.
É inolvidável que, dentre as obrigações das partes no contrato, inclui-se o dever de informação, consectário do princípio da boa-fé objetiva, sempre presente nas fases pré-contratual e também na execução do contrato. Consiste na obrigação de as partes prestarem todas as informações necessárias sobre o produto ou o serviço que porventura negociarão, bem como sobre o próprio contrato em si. O objetivo disso é que as partes tenham real ciência do que estão contratando, protegendo, desse modo, a confiança despertada de que as prestações da outra parte serão cumpridas conforme o ajustado.
Com efeito, se a apelada não deu causa à rescisão do contrato, como demonstrado, ela faz jus ao recebimento de indenização por perdas e danos.
“RECURSO ESPECIAL – AÇÃO CAUTELAR E INDENIZATÓRIA – RESCISÃO UNILATERAL DE CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS – DANOS EMERGENTES, LUCROS CESSANTES E DANOS MORAIS – PEDIDO ILÍQUIDO – SENTENÇA LÍQUIDA – POSSIBILIDADE – OMISSÃO NO V. ACÓRDÃO RECORRIDO –
INEXISTÊNCIA – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – PROPÓSITO DE PREQUESTIONAMENTO – MULTA – NÃO CABIMENTO – AFASTAMENTO – INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 98 DA SÚMULA/STJ – DANOS APURADOS EM PROVA PERICIAL – ENTENDIMENTO OBTIDO DA ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO – REEXAME DE PROVAS – IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA – ÓBICE DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ – NON REFORMATIO IN PEJUS EM SEDE RECURSAL – COMPROVAÇÃO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I – A rescisão contratual, sem aviso prévio, de distribuição de produtos de marca nacionalmente conhecida, sujeita a empresa culposa a indenizar os danos experimentados pela empresa prejudicada pela resilição unilateral, mormente pela longa relação contratual existente entre as partes, cuja abrupta diminuição da lucratividade provoca imediatas conseqüências sociais e econômicas.
II – Não constitui julgamento extra petita a decisão que fixa indenização líquida, embora formulado pedido ilíquido, quando presente elementos suficientes nos autos para a conclusão – Precedentes da 4ª Turma do STJ (Resp 423.120/RS, Rel. Min. RUY ROSADO DE AGUIAR, DJ de 21/10/02; REsp 647.448/RJ, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA, julgado em 02/08/2005, DJ
29/08/2005 p. 355).
III – O quantum indenizatório, relativamente a danos emergentes e lucros cessantes, foi fixado com base em minuciosa análise das provas dos autos. Rever tal entendimento, obviamente, demandaria o reexame dessas provas, o que é inviável em sede de recurso especial, a teor do disposto na Súmula 07/STJ.
IV – Nos termos do enunciado n. 98 da Súmula/STJ: “Embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório”.
V – Se os critérios de compensação dos créditos estabelecidos na sentença não foram objetos de recurso pela parte ex adversa, é vedada em sede de apelação sua modificação ex officio pelo tribunal a quo, eis que prejudiciais a recorrente, em atenção ao princípio do non reformatio in pejus.
VI – Recurso especial conhecido e parcialmente provido.” (REsp 401704 / PR, Relator Ministro HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/AP), T4 – QUARTA TURMA, DJe 02/09/2009) (g.n.)
Vale ressaltar que a previsão legal do artigo 720 e seu respectivo parágrafo único, do Código Civil/02, que trata da resilição dos contratos de agência e distribuição “por aproximação”, não é aplicável ao contrato de distribuição stricto sensu, que possui aplicação e efeitos diversos do primeiro.
Assim, diante da ausência de normas legais específicas ao contrato de distribuição stricto sensu e também de preceitos estipuladas contratualmente pelas partes, deve-se aplicar a regra geral sobre a extinção dos contratos disposta no Código Civil/02 pelos artigos 472 e seguintes, posto que concretizada a rescisão durante a sua vigência.
Sobre a resilição, dispõe, especificamente, que:
“Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte.
Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos”. (g.n.)
Da leitura do texto legal denota-se que a intenção do legislador foi de tentar materializar a quantificação dos danos que se limitariam ao investimento não recuperado, além de assegurar o equilíbrio contratual. Todavia, com a ausência de quaisquer parâmetros estabelecendo tais critérios, impossível evitar discussões jurídicas quanto ao thema.
No caso em testilha, contudo, com a realização dos trabalhos técnicos contábeis, foi possível aferir a média mensal do lucro líquido da autora no ano anterior à rescisão contratual. Sendo certo que no mês de setembro/2003 a apelada teve abrupta redução de seu faturamento, o que perdurou até março/2004, posto que em abril/2004 o faturamento deu sinal de recuperação (f. 269/270).
O Juízo a quo fixou a indenização tendo como base na média do faturamento mensal da requerente, multiplicado por 07 (sete), o número de meses que a autora teve o faturamento reduzido.
Tendo em vista a duração do vínculo contratual e a relevância econômica do contrato em relação à atividade negocial do distribuidor, tenho como razoáveis os critérios utilizados pelo Juízo primevo para fixar a indenização, pois só assim será possível a recuperação dos investimentos – pela sua natureza e vulto – realizados pela autora.
RECURSO ADESIVO – FORTIGÁS GV LTDA.
Pugna a apelante adesiva pela majoração da verba honorária sucumbencial, para o percentual de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.
Dispõe o art. 20, § 3º, do CPC:
“Art. 20. A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Essa verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria.
(…)
“§ 3º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação, atendidos:
a) o grau de zelo do profissional;
b) o lugar de prestação do serviço;
c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço”(g.n.)
Destarte, nos termos da norma supra, para fixar os honorários, o juiz deve considerar o grau de zelo do advogado, o lugar da prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
Assim, no caso dos autos, atento aos critérios estabelecidos pelo dispositivo supra, e, considerando o trabalho desempenhado pelo procurador da requerente, entendo que a verba honorária arbitrada (10% sobre o valor da condenação) mostrou-se reduzida, devendo ser majorada para 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, percentual que, a meu ver, se mostra justo e razoável para remunerar o ilustre causídico.
DISPOSITIVO
Com tais considerações, pois, nego provimento ao primeiro recurso e dou parcial provimento ao apelo adesivo, para majorar a verba honorária para 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, § 3º, do CPC.
Ante a sucumbência mínima, por parte da segunda apelante, condeno a primeira apelante ao pagamento da totalidade das custas recursais.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): EDUARDO MARINÉ DA CUNHA e IRMAR FERREIRA CAMPOS.
SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO PRINCIPAL E DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO ADESIVO.
Fonte: www.cc2002.com.br