No dia 30 de maio de 2014 na mais nova boate de São Luís/MA, Pink Elephant Club, tivemos mais um grande exemplo de descumprimento aos direitos e garantias básicas do Consumidor.
Segundo denúncias de vários consumidores por volta das 4h da manhã, faltou energia em todo bairro da Ponta d’ Areia, incluindo a referida boate, que por falha ou falta do gerador, não conseguiu prosseguir com a realização do evento.
Informações cedidas por Ricardo Cruz e Rodrigo Escórcio (Membros do Movimento de Defesa do Consumidor Maranhense – MDCMA) em razão da falta de energia, às escuras, e sem ventilação ideal, um tumulto se iniciou, e clientes desesperados tentaram sair. Porém, os seguranças recebiam ordens para não permitir que ninguém deixasse as instalações da boate, pois esta utiliza o sistema de comandas, onde o pagamento da conta é realizado ao final do evento, e, por conta da falta de energia, este, restou impossibilitado.
Após mais de 40 minutos, os seguranças ainda bloqueavam a saída das pessoas, muita gente começou ligar para o 190 – número de emergência da polícia militar – para relatar o cárcere privado (Art. 148 Código Penal). Algumas pessoas já desesperadas, diante aquela situação claustrofóbica, empurraram tentando forçar uma saída, oportunidade onde os seguranças responderam com choques e agressões físicas (Art. 129 Código Penal).
Tão somente com a chegada da polícia os seguranças liberaram a saída.
Após o fato ter tomado grande proporções nas redes sociais – infelizmente até o momento não passou disso – em nota a Boate Pink, pediu desculpas e disse que “imprevistos acontecem”.
Ouso discordar da nota apresentada, mas, a falta de energia é totalmente previsível. Por esta razão, para a realização de um evento de qualidade, se faz necessário como requisito mínimo a aquisição de um gerador.
Com base no Código de Defesa do Consumidor a prestadora de serviço tem o dever de garantir a qualidade deste, zelando sempre pela vida, saúde e segurança dos consumidores. Devendo responder, independentemente da existência de culpa, pelos danos que a estes forem causados (Art. 14 Lei nº 8.078/90).
Saliento que não haveria qualquer problemática em liberar a saída dos consumidores. Afinal, quando se entra na referida boate todos realizam um cadastro, informando dados como telefone, endereço, e-mail, etc. Essas informações ficam salvas nos registros da casa noturna, o que permite a esta realizar possíveis cobranças posteriores, sem que cause ao consumidor qualquer dano ou constrangimento (Art. 42 e 71 da Lei nº 8.078/90).
Além do mais, em razão da teoria do risco da atividade, por mais que não houvesse qualquer controle de dados, este prejuízo deveria ser suportado pelo fornecedor, ou seja, pela boate. Em hipótese alguma, deveria o consumidor ter suportado a referida situação, e ter flexibilizado seus direitos e garantias fundamentais essências à dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III e 5º Constituição Federal).
Esta situação me recordou a manhã do dia 27 de janeiro de 2013, quando o Brasil acordou de luto em razão do incêndio na boate Kiss em Santa Maria, no estado do Rio Grande do Sul, onde um “imprevisto” tirou a vida de 242 jovens e feriu outras 116. Em meio à repercussão de tais fatos, um movimento de fiscalização na época cominou em fechamento e adequação parcial de diversas boates e casas de shows em todos os estados brasileiros, inclusive em nosso estado. No dia 10 de abril de 2014 a Câmara dos Deputados, aprovou o Projeto de Lei nº 2020/07 “Lei Kiss”, que retira a cobrança por meio de comandas e atualiza as regras de prevenção e combate a incêndios em casas noturnas e similares no Brasil. O texto, agora, segue para o Senado, onde precisa ser aprovado antes da sanção da presidente Dilma Rousseff.
A tragédia na Boate Kiss poderia ter sido minimizada consideravelmente se os seguranças não tivessem bloqueado a saída das pessoas para que primeiro efetuassem o pagamento. Há menos de uma semana, fato semelhante ocorreu em São Luís. Até quando os direitos fundamentais serão flexibilizados em prol do interesse privado!? Será que a tragédia ocorrida na Boate Kiss já não serviu como um grande e aterrorizante alerta?! Até quando os órgãos de proteção aos consumidores vão permitir que situações como estas se repitam?! Pessoas têm valor, e não preço! Antes de Consumidores somos Cidadãos!