Sirvo meus amigos com a recente decisão do STJ (REsp 1.203.144-RS, 4ª Turma, Rel. Min Luis Felipe Salomão, j. 27.5.2014):
DIREITO DAS SUCESSÕES E DAS COISAS. RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO. VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. COMPANHEIRA SOBREVIVENTE. MANUTENÇÃO DE POSSE. POSSIBILIDADE DE ARGUIÇÃO DO DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. ART. 1.831 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002.
1. É entendimento pacífico no âmbito do STJ que a companheira supérstite tem direito real de habitação sobre o imóvel de propriedade do falecido onde residia o casal, mesmo na vigência do atual Código Civil. Precedentes.
2. É possível a arguição do direito real de habitação para fins exclusivamente
possessórios, independentemente de seu reconhecimento anterior em ação própria declaratória de união estável.
3. No caso, a sentença apenas veio a declarar a união estável na motivação do decisório, de forma incidental, sem repercussão na parte dispositiva e, por conseguinte, sem alcançar a coisa julgada (CPC, art. 469), mantendo aberta eventual discussão no tocante ao reconhecimento da união estável e seus efeitos decorrentes.
4. Ademais, levando-se em conta a posse, considerada por si mesma, enquanto mero exercício fático dos poderes inerentes ao domínio, há de ser mantida a recorrida no imóvel, até porque é ela quem vem conferindo à posse a sua função social.
5. Recurso especial desprovido.
Essa decisão reflete na seguinte situação:
João e Maria viviam em união estável e moravam juntos em uma casa.
João tinha quatro filhos do primeiro casamento que não moravam com ele.
Quando João faleceu, seus filhos iniciaram o processo de inventário e notificaram Maria para desocupar o imóvel.
Pois bem, nesta situação Maria poderá residir no imóvel, mesmo havendo quatro filhos do falecido, já que a companheira possui direito real de habitação.
Na verdade, Maria poderá ajuizar ação de manutenção de posse contra os filhos de João invocando o direito real de habitação.
Ressalte-se que o direito real de habitação está previsto no Artigo 1.831 do Código Civil:
Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.
No artigo supracitado, consta o direito real de habitação para as pessoas casadas em qualquer regime de bens, mas o STJ expandiu tal direito para os casos de UNIÃO ESTÁVEL.
Em tal decisão, entendeu o STJ que, apesar de o Artigo 1831 CC não ter mencionado a palavra ¨companheiro sobrevivente¨, este dipositivo deverá ser interpretado conforme a regra contida no art. 226, §3º, da CF/88, que reconhece a União Estável como ENTIDADE FAMILIAR.
Neste diapasão, o STJ buscou uma interpretação que garantiu à pessoa que viva em união estável os mesmos direitos que teria caso fosse casada.
Vale mencionar o Enunciado 117 da I Jornada de Direito Civil:
¨O direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, seja por não ter sido revogada a previsão da Lei 9.278, seja em razão da interpretação analógica do artigo 1.831, informado pelo artigo 6º, caput, da Constituição de 88¨.
OBSERVAÇÃO IMPORTANTE: Para o STJ, para poder se beneficiar do direito real de habitação, não é necessário que a companheira sobrevivente tenha buscado o reconhecimento da União Estável antes do falecimento do companheiro.
Desta forma, a companheira supérstite, mesmo não possuindo algum documento prévio de formalização da união estável, será mantida no imóvel em que residia junto com o falecido.
Por fim, impõe-se que, nos autos de uma ação de manutenção de posse, o reconhecimento da união estável ocorre de forma incidental, sem repercussão na parte dispositiva da sentença, não possuindo validade para fins sucessórios, sendo necessário que a companheira sobrevivente busque outra ação para ser reconhecida como herdeira.
Fonte: Eduardo Noleto (Advogado colaborador).